The leukemia that a couple of days ago killed Edward Said lasted long enough for the polemist and political activist who had settled in the US to watch his projects and hopes crumble.
Said owes his fame to having become the most articulate apologist for the "palestinian cause", something that wasn’t all that difficult when one considers that most of his rivals in this field, whenever they’re not too busy blowing up school buses and pizza parlours, satisfy themselves spreading anti-Semitic forgeries like "The Protocols of the Sages of Zion". Even so, although his prose reminds one of a post-modern English version of a deconstructionist French translation of the Germanic ravings of some Heidegger epigone, his academic dance of the seven veils with successive layers of Marxist, anti-imperialist and post-colonial jargon never hid the fact that his goals were fundamentally the same.
A large part of his so-called moral authority came from Said presenting himself as a refugee from a Palestinian homeland. In spite of having been put in doubt by his adversaries, the truth or falsity of this claim isn’t too important. The internal borders of the Arab world are all artificial and, half a century ago, loyalties there were established in relation do clans, families, cities or villages and religious sects, not countries or nations, an European import that has had no time to grow deep roots in the Middle East. The Palestinian nationality as a distinct identity has not begun to be developed before the 60s.
Born in an upper middle class Christian family, a student at the best local schools and a member of the most exclusive clubs, Said became since the 50s an American and he benefited both from this condition and from the romanticized image of an exile to reach the top of the academic pecking order. Since the beginning of the anti-Vietnam movements in the following decade, any cause that could be related to the Third World became first popular and then compulsory among Western intellectuals. Attuned to such a context, Said, whose speciality were Literary Studies, published in 1978 the book that would make him famous, assuring his role of guru almost until his death: “Orientalism”.
His "classic" is a confused, misinformed and angry diatribe that consists in applying to a particular case an overused generic thesis according to which intellectuals are mostly the servants of the ruling class. What “Orientalism” tries to show through half-truths, non-sequiturs, weird examples and exceptions turned into rules is that the discipline or, rather, the disciplines generically called Orientalism that study the Eastern peoples and cultures are nothing but the theoretical arm of imperialism. In short, whoever studied difficult languages such as Chinese or Sanskrit, whoever translated or annotated old or forgotten Japanese or Persian works, whoever unearthed lost temples and palaces did it only for the profit of British or French capitalists.
If such a childish reductionism weren’t enough, the author limited his analysis to the less Oriental of all the non-European regions: the Arab-Muslim world. Surrounding the publication of his work with a whole series of polemics where, to any substantive objection, he only answered questioning the ideological credentials of his critics, he managed, helped by the spirit of the times, to turn his book in the cornerstone of an academic fashion that is still strong enough, that is, judging people and works according not to scholarly criteria but in the light of their political choices. His greatest success was to have coined the very expression "Orientalism", making it work, like similar terms (fascist, racist, communist), as an insult that, shutting up those with a different point of view, allows its users to avoid any discussion.
One year later, in 1979, he published his other "classic", « The Question of Palestine », a book the purpose of which was to narrate the tragedy of his people but which touches historical truth only tangentially, at best. Among the many lies with which this deformed view of the past is built, the most scandalous is the mysterious disappearance of the Grand Mufti of Jerusalem, Hadjj Amin al Huseini (1893-1974). The main leader of what Said calls Palestine and of its revolt, in 1936-39, against British rule, the ally of the Nazis who wanted Hitler to help him exterminate the Jews of Haifa and Tel Aviv, the personality that dominated, between the 20s and the 60s, the life of the local Arabs, taking them from catastrophe to catastrophe, makes only one very brief appearance in the whole volume. It is as if a history of the US or Italy, covering the same period, simply omitted the names of FDR or Mussollini.
For two long decades, until the day when the Al Qaeda atrocities, demoralizing his apologetic view of the Islamic world, occasioned his final eclipse by his nemesis, Bernard Lewis, Said kept a powerful and evil hold over many intellectuals. And, though below such euphemisms as the “creation of a secular bi-national state where Jews and Arabs would live democratically together” what really lurked was his mad dream of abolishing Israel, something that would result in the extermination of its “non native” population, the real victims of his ideas were first and foremost his own countrymen whom he helped to guide towards new disasters.
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Folha de S. Paulo, 29 de setembro de 2003
NELSON ASCHER
NELSON ASCHER
Edward Said (1935-2003)
A leucemia que, há poucos dias, matou Edward Said prolongou-se o bastante para que o polemista e ativista político radicado nos Estados Unidos pudesse assistir à falência de seus projetos e expectativas.
Said deve sua reputação a ter se tornado o mais articulado defensor da "causa palestina", algo que nada tinha de difícil se considerarmos que seus competidores nessa área, quando não estão ocupados explodindo ônibus escolares ou pizzarias, satisfazem-se divulgando falsificações anti-semitas como "Os Protocolos dos Sábios de Sião". Ainda assim, se bem que sua prosa evoque uma versão pós-moderna para o inglês de uma tradução desconstrucionista francesa dos delírios germânicos de algum epígono de Martin Heidegger, sua dança acadêmica dos sete véus, sobrepondo camadas de jargão marxista, antiimperialista e pós-colonial, jamais ocultou que seus objetivos eram idênticos.
Boa parte de sua, digamos, autoridade moral resultava de ele se apresentar como um refugiado da terra natal palestina. Não obstante ter sido posta em dúvida por adversários, a veracidade ou não dessa reivindicação é uma questão secundária. As fronteiras internas do mundo árabe são artificiais e, meio século atrás, as lealdades se estabeleciam em relação a clãs, famílias, cidades ou aldeias e seitas religiosas, não a países ou nações, uma importação européia que nem sequer teve tempo de se aclimatar ao Oriente Médio. A nacionalidade palestina, como identidade distinta, começou a ser elaborada somente nos anos 60.
Nascido numa família da alta classe média cristã, educado nas melhores escolas, frequentador dos clubes mais exclusivos, Said tornou-se, desde os anos 50, um norte-americano e beneficiou-se tanto dessa condição como da imagem romantizada de exilado para atingir o ápice do mandarinato universitário. A partir dos movimentos de contestação à Guerra do Vietnã na década seguinte, a defesa de qualquer causa remotamente vinculada ao Terceiro Mundo tornou-se primeiro popular e logo compulsória entre os intelectuais do Ocidente. Sensível a tal contexto, Said, que se especializara em estudos literários, publicou em 1978 o livro que o projetaria, garantindo-lhe, quase até o final da vida, o papel de guru: "Orientalismo".
Seu "clássico" é uma diatribe confusa, desinformada e raivosa que se resume na aplicação a um caso particular da batida tese genérica de acordo com a qual intelectuais são, em sua maioria, lacaios da classe dominante. O que "Orientalismo" tenta expor com meias verdades, com um "non sequitur" após o outro, com exemplos abstrusos e exceções convertidas em regras, é que o orientalismo, a disciplina, ou melhor, o conjunto de disciplinas dedicadas ao estudo dos povos e culturas ao leste da Europa não passa do braço teórico da prática imperial. Trocando em miúdos, quem quer que tenha se aprofundado no estudo de línguas difíceis, como o chinês ou o sânscrito, traduzido e anotado obras antigas ou esquecidas da Pérsia ou do Japão, localizado e restaurado as ruínas de templos e palácios soterrados fez o que fez para que capitalistas londrinos ou parisienses extraíssem confortavelmente a mais-valia gerada por povos distantes.
Não bastasse seu reducionismo pueril, o autor circunscreveu sua análise à menos oriental das regiões extra-européias: o mundo árabe-islâmico. Envolvendo a publicação de sua obra numa sucessão de polêmicas em que às objeções substantivas retorquia questionando as credenciais ideológicas de seus críticos, ele conseguiu, auxiliado pelo espírito da época, transformá-la na pedra angular da moda acadêmica que vigora até hoje: a de julgar pessoas e trabalhos não por seus méritos científicos, mas por suas opções políticas. Seu grande sucesso reside em ter, com a expressão "orientalismo" , cunhado um insulto que, como "fascista", "racista" ou "comunista", possibilita ao usuário esquivar-se do debate desqualificando os interlocutores.
Um ano depois, em 1979, sairia seu outro "clássico", "A Questão da Palestina", um livro que pretende narrar a tragédia de seu povo, mas cujos contatos com a verdade histórica são, na melhor das hipóteses, tangenciais. Em meio às incontáveis mistificações sobre as quais se constrói essa versão deformada do passado, a mais escandalosa é o misterioso desaparecimento do Grão Mufti de Jerusalém, Hadj Amin Al Husseini (1893-1974). O principal líder político daquilo que Said chama de Palestina, o desencadeador e dirigente da revolta antibritânica de 1936-39, o aliado dos nazistas que tentou convencer Adolf Hitler a exterminar os judeus de Tel Aviv e Haifa, a personalidade que dominou a vida dos árabes da região entre os anos 20 e 60, conduzindo-os de catástrofe em catástrofe, aparece uma única vez, de passagem, no livro inteiro. Isso equivale a escrever sobre os EUA ou a Itália dos mesmos anos omitindo respectivamente os nomes de Roosevelt e Mussolini.
Durante duas boas décadas, até que os atentados bin-ladenistas, desmoralizando sua apresentação apologética do mundo islâmico, levassem seu arqui-rival, o arabista octogenário Bernard Lewis, a eclipsá-lo, Said exerceu uma influência intelectual tão avassaladora quanto perniciosa. E, embora sob eufemismos, como o da criação de um país binacional onde judeus e árabes convivessem democraticamente, ele continuasse acalentando o sonho maníaco de abolir Israel, exterminando-lhe os habitantes "não-nativos", as verdadeiras vítimas de suas idéias foram antes seus conterrâneos, que ele ajudou a conduzir rumo a novos desastres.
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Após a publicação desse obituário de Edward Said na Folha de SP, diversos “intelectuais” criticaram Ascher por dizer a verdade, ao mesmo tempo em que mentiam sobre a nacionalidade, sobre as intenções e sonhos de Said (“...os que alimentam, como fez o intelectual palestino durante toda a sua vida, a esperança de ver israelenses e palestinos conviverem em paz, com justiça”) e se negavam – ou não conseguiam – responder as verdades que o jornalista escreveu (“O escrito é uma baixeza deliberada e covarde, que merece repúdio, e não resposta”).
Como bem disse Olavo de Carvalho, “Os insatisfeitos dizem que ele não merece resposta, mas é porque a verdade não tem mesmo resposta. Eles podem ficar brabos o quanto queiram, mas isso não vai melhorar em nada uma reputação de historiador que o próprio Eduardo Said arruinou para sempre com uma autobiografia fraudulenta. Piores do que esse vigarista intelectual, porém, são aqueles que o admiram e que querem protegê-lo da verdade”.
Mas o que realmente me surpreendeu foi ler os nomes dos “intelectuais” que assinaram tal manifesto. De Marilena Chauí e Emir “GetuLHo” Sader até José Arbex Jr., o mesmo que publicou na Carta Capital a “notícia” que o Estado de Israel estava projetando uma bomba étnica (pois é, não é piada!) que mataria árabes sem causar baixas entre israelenses.
Ê intelectuais...
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2 comments:
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